A NATUREZA EM NOSSAS CASAS: A Biodiversidade está muito mais perto do que pensamos

14/12/2021

José Truda Palazzo Jr


Com quase 44 anos de atuação na área ambiental, e muito do meu tempo dedicado aos grandes temas globais - conservação marinha em particular - e aos tratados internacionais, conferências e congressos onde o destino da Vida no planeta é decidido, seria fácil esquecer que, aqui mesmo na cidade onde vivemos, a Natureza bate à nossa porta. Não esqueço nunca disso, entretanto, por uma simples razão: sou jardineiro. 

Qualquer um que tenha tido a experiência de descansar a cabeça fazendo um jardim e cuidando-o por algum tempo é capaz de apreciar esse fato que costuma passar despercebido na nossa correria urbana: existe enorme biodiversidade nas nossas cidades. Do solo vivo dos jardins e praças, onde milhares de espécies de microorganismos e pequenos animais asseguram com suas complexas interações a sobrevivência das plantas acima da superfície, até o telhado de nossas casas e em reentrâncias de altos prédios onde a fauna um pouco maior encontra abrigo, nossas cidades são verdadeiros oásis para as espécies que conseguiram aprender a conviver com a presença humana. 

Mas e nós, aprendemos a conviver com a fauna nas cidades? 

Pergunte a um gambá, e a resposta certamente será um sonoro não

Confundidos com ratos (não são roedores, são marsupiais, levando os filhotes na bolsa como os cangurus e coalas), falsamente acusados de espalhar doenças (pelo contrário, ao predar sobre escorpiões, baratas, carrapatos e mesmo cobras venenosas, eles são aliados da saúde pública), esses bonitos e inofensivos mamíferos conseguiram se adaptar à destruição dos ambientes naturais pela urbanização, e hoje habitam boa parte das cidades brasileiras, se ocultando durante o dia nos forros dos telhados, ocos ou copas de árvores frondosas ou outros cantos escuros, e à noite saem em busca de alimento. A ignorância e a maldade das pessoas faz com que sejam frequentemente perseguidos sem trégua, mortos a pauladas, atropelados propositalmente ou até queimados vivos por gente sem alma. O problema se agrava quando as fêmeas estão com suas bolsas (marsúpios) cheios de filhotes, ou então os carregando nas costas; aí elas ficam mais lentas, e os tarados assassinos, bem como os cães nos pátios, as alcançam com mais facilidade. 

Quando as mãezinhas morrem e seu corpinho esfria, muitas vezes os bebês saem da bolsa, indefesos e assustados, e sem auxílio morreriam lentamente de fome e frio. Em alguns casos,  pessoas de boa índole os resgatam e entregam a voluntários ou aos poucos centros de resgate de fauna existentes. 

Assim como os gambás, os utilíssimos morcegos insetívoros, nectarívoros e frugívoros, as pequenas aranhas inofensivas de nossos jardins e a maioria dos insetos fazem parte da "fauna amaldiçoada", vítimas de uma perseguição boçal de parte dessa imensa maioria de brasileiros sem qualquer noção sobre a importância de todas essas vidas que dividem o espaço urbano conosco. As aves se salvam na maioria das vezes, desde que não sejam "feias" como os urubus ou "tragam má sorte" como as corujas... às vezes parece que o festival de idiotices contra a fauna nunca tem fim!

Enfim, frente a tudo isso, cabe a nós, a ínfima minoria esclarecida, confrontar esse estado de coisas. Não podemos nos conformar nem nos calar. Precisamos ir às ruas defender os gambás, os morcegos, batalhar por jardins mais ecológicos e parques e praças com mais árvores nativas; temos de invadir as escolas com informação correta sobre os animais e a Natureza, estimular os mestres a educar para a cidadania ambiental, incutir nos mais jovens uma mentalidade de respeito e harmonia para dividirmos com alegria nosso planeta, nossas cidades e nossas vidas com as demais espécies. 

Pensar globalmente e agir localmente nunca foi uma premissa tão necessária. É hora de acabar com o morticínio da fauna urbana e de construirmos cidades mais amigáveis à biodiversidade. Façamos nossa parte!

Para fazer mais: para contribuir até fevereiro de 2022 com nossa campanha para educar para a proteção dos gambás, acesse este link

Para saber mais: Meu artigo sobre os gambás e a fauna nas cidades pode ser lido aqui. Minha entrevista sobre o mesmo tema está neste link. Meu livro sobre jardinagem ecológica, A Natureza no Jardim, pode ser adquirido neste link da Amazon. E um excelente artigo sobre a importância das cidades para a conservação da biodiversidade, em Inglês, pode ser lido aqui.

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